O jornal
O Globo publicou hoje um artigo que escrevi sobre a política de conteúdo local no setor de petróleo. Para quem não leu, ele segue transcrito abaixo.
Falta Foco
Com o advento do pré-sal, os investimentos na produção e exploração
de petróleo podem chegar a 400 bilhões de dólares nos próximos dez
anos. O governo tem encarado esses investimentos como uma oportunidade
para desenvolver setores industriais associados, direta ou
indiretamente, ao petróleo. A principal ferramenta usada pelo governo
para alcançar este objetivo tem sido a política de conteúdo local.
Será essa uma boa estratégia? A resposta depende de qual objetivo se
quer alcançar, além, claro, dos detalhes da execução da política.
Para o fomento de novos setores, não se deve maximizar o conteúdo
local, mas a chance de desenvolver empresas competitivas, capazes de
caminhar com as próprias pernas. Para isso, o requerimento de conteúdo
local deve ter data para acabar, com redução gradativa do aparato
protecionista. Caso contrário, há o risco de criar indústrias
ineficientes, incapazes de competir internacionalmente, dependentes
eternas da demanda cativa garantida pela política industrial. Temos
inúmeras experiências desse tipo, a Lei de Informática talvez seja o
exemplo mais emblemático. Países como a Noruega fugiram dessa armadilha e
foram bem-sucedidos, o que mostra que há alternativas.
A política atual não só não tem regras de saída, como carece de
foco. Hoje ela alcança uma gama muito ampla de setores. Faria mais
sentido econômico concentrar o foco naqueles setores mais diretamente
relacionados ao petróleo. Serão esses os mais fortemente impactados
pela demanda advinda da exploração e produção de petróleo no pré-sal.
Desses, também é preciso selecionar os que têm perspectiva de se
tornarem competitivos. Para estes, a política de conteúdo local deve
funcionar como impulso inicial, que deve ser removido ao longo do
tempo, pela gradual exposição à competição internacional, algo que não
foi sinalizado pela atual política.
Para os setores que já estão estabelecidos no Brasil, mas que podem
se beneficiar da demanda do setor de petróleo - siderurgia, por exemplo
-, o mais adequado é adotar políticas que aumentem a sua
competitividade (redução de carga tributária, diminuição do preço da
energia, entre outras), e não políticas de conteúdo local.
Por fim, é preciso atenção especial à inovação. Programas como o
Inova Petro, recentemente lançado pelo governo, são importantes.
Mas não basta financiar e reduzir o custo da atividade inovadora. É
preciso torná-la um imperativo para as empresas. Nesse sentido, a
concorrência é uma ferramenta muito poderosa: empresas não inovam por
acaso, mas para obter vantagens sobre seus concorrentes. Novamente, é
preciso expor gradualmente o mercado doméstico à competição
internacional, de modo a construir os incentivos corretos para o
investimento em inovação.
É difícil mudar as regras nos contratos em vigor. Mas para as
próximas rodadas de licitação temos a oportunidade de fazer as
mudanças, tornando a política de conteúdo local mais efetiva e com
maior chance de sucesso.