sexta-feira, 15 de junho de 2012

A Maldição do Excesso

Ontem saiu um artigo de minha autoria no jornal O Globo. Ele aborda a questão da divisão dos royalties do petróleo. Engraçado é que o título orginial era  Sobre o que não se tem discutido a respeito dos royalties do petróleo, sabiamente alterado pelos editores do jornal para A maldição do excesso. Ou seja, o título do meu artigo também sofria da maldição do excesso. Segue a seguir a transcrição do artigo, para quem ainda não leu.

A Maldição do Excesso

A proposta do governo federal para mudança do marco regulatório da exploração do pré-sal acabou trazendo à tona a discussão sobre a divisão dos royalties do petróleo, tema que tem dominado a agenda política ligada ao setor. Entretanto, tão ou mais importante do que o debate sobre como dividir os royalties é a discussão sobre como esses recursos são utilizados. Em particular, se eles têm garantido melhora no bem-estar da população dos municípios contemplados com os recursos provenientes da exploração do petróleo.

A Lei do Petróleo define que os recursos dos royalties somente podem ser usados para investimentos. Trata-se de regra desejável: o petróleo é um recurso finito e é preciso garantir que as futuras gerações também usufruam da renda gerada pela sua exploração. Desse modo, o aumento dos recursos à disposição das prefeituras dos municípios que recebem royalties incrementou sua capacidade de investimento. Esse incremento tem expandido o tamanho das máquinas públicas municipais (por exemplo, pelo aumento do número de funcionários públicos), mas não tem se traduzido em melhora proporcional de diversos indicadores sociais, especialmente aqueles ligados a educação e saúde, tampouco em aumento do acesso dos cidadãos a serviços de infraestrutura. Com relação ao crescimento do PIB municipal, as evidências são análogas, em média os municípios contemplados pelos royalties crescem relativamente menos que os demais.

Nesse ponto, cabe uma explicação adicional sobre a afirmação de que os indicadores sociais não melhoraram. Nos últimos anos esses evoluíram positivamente em boa parte dos municípios brasileiros? Entretanto, a questão é identificar o quanto desse aumento é resultado dos royalties. Ou seja, não basta os indicadores sociais estarem melhorando nos municípios que recebem royalties: é preciso que essa melhora seja maior do que naqueles que não recebem esses recursos. Sendo assim, a comparação mais adequada é do grupo de municípios que recebem royalties com o dos que não recebem, mas têm características semelhantes aos que recebem.

A literatura consagrou o termo "maldição dos recursos naturais" para descrever a tendência de países com abundância de recursos naturais se desenvolverem relativamente menos. No Brasil, aparentemente, essa maldição está se manifestando no nível municipal. Nesse caso, provavelmente se trata de resultado da fragilidade das instituições locais. A experiência internacional indica que instituições que melhoram o controle social dos recursos do petróleo tendem a mitigar os problemas associados ao seu mau uso.

0 grande desafio é garantir que as instituições municipais se desenvolvam a ponto de prover esse controle de forma satisfatória. Sem isso, qualquer discussão sobre a divisão dos royalties do petróleo perde o sentido.